Natureza e artificialidade no projeto socialista de nação de José Carlos Mariátegui

  • Nature and Artificiality in José Carlos Mariátegui’s Socialist Project of Nationhood
  • Nature et artificialité dans le projet socialiste de nation de José Carlos Mariátegui

DOI : 10.35562/textures.496

A obra do marxista peruano José Carlos Mariátegui persegue um objetivo constante: criar as condições práticas, políticas, teóricas e sociais de uma sociedade peruana socialista livre de opressão e de explotação. Este artigo pretende mostrar que Mariátegui recorre ao binômio naturalidade – artificialidade para revelar, por um lado, a função parasitária da classe dominante e, por outro, os pontos que unem os hábitos coletivistas pré-capitalistas das comunidades indígenas e a teoria socialista moderna. Para isso, Mariátegui opera uma releitura crítica da história peruana, opondo a conquista espanhola e o período colonial ao Império inca como figuras de artificialidade e de naturalidade, respectivamente. O trabalho mostra que essa chave heurística abre possibilidades críticas para uma análise tanto da inserção do Peru no capitalismo quanto da natureza predatória do modelo social e econômico do período republicano. Finalmente, discute-se a interpretação historicista e dialética da modernidade que Mariátegui desenvolve, aprofundando sua ideia de um “Peru integral” como nação socialista não essencialista, na qual elementos pré-modernos e modernos se conjugam em prol de um projeto revolucionário. A natureza e o artifício aparecem em Mariátegui como duas figuras centrais na formação social peruana e, portanto, como uma das faces da luta de classes.

The works of Marxist Peruvian thinker José Carlos Mariátegui all constantly seek one goal: to create political, theoretical and social conditions for a socialist society in Peru, free from oppression and exploitation. This paper purports to show that Mariátegui resorts to the opposition between natural and artificial processes in order to reveal, on the one hand, the parasitic function of the ruling class while, on the other, the common features that unite the collectivist pre-capitalist working habits of the indigenous communities with modern socialist theory. To that end, Mariátegui sets forth a critical reinterpretation of Peruvian history in which the Spanish conquest and the colonial period appear as figures of artificiality and the Inca empire’s structure as a natural one. The paper demonstrates that this heuristic key leads to an analysis of both Peru’s integration into the global market and the predatory nature of the social model during the Republican period. Finally, Mariátegui’s historicist and dialectical interpretation of modernity is discussed, deepening his idea of an “integral Peru” as a non-essentialist socialist nation in which pre-modern and modern elements join together in a revolutionary endeavor. Nature and artificiality are two central images in Mariátegui’s interpretation of Peruvian social formation, and, as such, they are one of the facets of the class struggle.

L’œuvre du marxiste péruvien José Carlos Mariátegui poursuit un objectif constant : créer les conditions pratiques, politiques, théoriques et sociales d’une société péruvienne socialiste libérée de l’oppression et de l’exploitation. Cet article cherche à montrer que Mariátegui recourt au binôme naturel-artificiel pour révéler, d’une part, la fonction parasitaire de la classe dominante et, d’autre part, les points qui unissent les habitudes collectivistes précapitalistes des communautés indigènes et la théorie socialiste moderne. À cette fin, Mariátegui opère une relecture critique de l’histoire péruvienne, en opposant la conquête espagnole et la période coloniale à l’empire inca comme respectivement des figures d’artificialité et de naturalité. L’article montre que cette clé heuristique ouvre des possibilités critiques pour une analyse de l’insertion du Pérou dans le capitalisme et de la nature prédatrice du modèle social et économique de la période républicaine. Enfin, l’interprétation historiciste et dialectique de la modernité développée par Mariátegui est discutée, approfondissant son idée d’un « Pérou intégral » en tant que nation socialiste non essentialiste, dans laquelle les éléments pré-modernes et modernes se combinent au service d’un projet révolutionnaire. La nature et l’artifice apparaissent chez Mariátegui comme deux figures centrales de la formation sociale péruvienne et, par conséquent, comme l’un des visages de la lutte des classes.

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Introdução

A obra do antropólogo francês Philippe Descola Par-delà nature et culture começa com os seguintes versos de Fernando Pessoa1:

Vi que não há Natureza,
Que Natureza não existe,
Que há montes, vales, planícies,
Que há árvores, flores, ervas,
Que há rios e pedras,
Mas que não há um todo a que isso pertença,
Que um conjunto real e verdadeiro
É uma doença das nossas ideias.
A Natureza é partes sem um todo
Isto é talvez o tal mistério de que falam.
Fernando Pessoa, Poemas de Alberto Carneiro.

De fato, a ideia de natureza como totalidade oposta à cultura e, portanto, como separação radical entre o mundo humano e os demais reinos (animal, vegetal e mineral) tem história. Ela surge em determinado espaço e momento e participa da formação de uma cosmogonia (uma Weltanschauung) com a qual os povos vencidos nos processos colonizadores a partir do século xv tiveram que lidar. Assim, enquanto o relativismo próprio da antropologia traz consigo uma valiosa historicização das categorias de cultura e natureza, o colonialismo aparece como um imenso processo de ampliação do domínio ocidental sobre outras civilizações e de produção de hierarquias. Similares a Robinson Crusoé chegando à ilha deserta repleto de engenhosidade utilitarista, o conquistador e o colonizador surgem como a linha de frente de um processo que segue até hoje a sua expansão, fazendo da justaposição de civilizações um grande organismo gradualmente subsumido ao modo de produção capitalista. Se a ideia de natureza é uma doença de nossas ideias, nas palavras de Fernando Pessoa, ela se espalhou como se espalharam pelas Américas a varíola, a sífilis e a cobiça pelo ouro. A modernidade capitalista define então um antes e um depois, onde conquistas e massacres são encobertos pela gesta da ideologia do progresso, e os universos pré-modernos fatal e teleologicamente condenados.

O marxismo surge como uma das correntes ideológicas que brotam da modernidade. Filho do liberalismo e do movimento operário, ele compartilhou por algum tempo a arrogância ocidental perante o mundo. Nesse contexto, a obra do marxista peruano José Carlos Mariátegui aparece como um divisor de águas na América Latina2. Seu papel inaugural, sua crítica ao etapismo nascente e sua leitura frutífera da realidade da formação social peruana permitem que seus textos sejam ressignificados hoje. Em particular, a postura dialética que ele adota o leva a questionar a naturalidade, a evidência de certos aspectos tanto da história peruana quanto do próprio marxismo, e a buscar as origens da formação social peruana no embate destrutor que foi a conquista. Procurando entender a “realidade” peruana para poder transformá-la, a obra de Mariátegui se constrói a partir das rupturas e continuidades que ele enxerga no Peru dos anos 1920, oriundas da irrupção violenta dos colonizadores europeus. Destaca-se uma polaridade natureza / artificialidade que atravessa os seus textos e forma uma chave de entendimento tanto do caráter socioeconômico das determinações da formação social peruana como das modalidades da sua inserção no mundo.

A “realidade” peruana entre pré-capitalismo e imperialismo

Em 7 ensaios de interpretação da realidade peruana, Mariátegui participa de uma longa tradição de crítica à exclusão das massas indígenas e de denúncia das violências e espoliações sofridas a partir da conquista espanhola. Porém, ao contrário de outros autores indigenistas, o seu critério é econômico e social e ele se fundamenta na questão da produção. Em busca da “realidade” do Peru, Mariátegui renova a compreensão da natureza das relações de produção e das variadas formas de exploração vigentes no país.

Para Mariátegui, a conquista pelos espanhóis não pode se resumir a uma gesta gloriosa. Na medida em que derruba um império potente, ela provoca uma ruptura decisiva na história peruana e introduz formas organizativas alheias às populações locais, inserindo uma dualidade. O argumento central de Mariátegui para fundamentar sua tese de uma oposição secular entre dois “Perus” é duplo: por um lado, defende o caráter intrinsecamente colonial da formação social pós-conquista; por outro, considera como meramente militar e eclesiástico o processo pelo qual o domínio inca foi substituído pelo domínio ibérico, sendo este incapaz de desenvolver um modelo econômico eficaz3. Reiteradamente, o texto sublinha como a conquista rompe uma ordem “orgânica”, que “brota espontaneamente do solo”, em que a população cresce e suas necessidades são satisfeitas. Sobretudo, Mariátegui insiste na organicidade da formação social imperial. Sem escamotear a violência e a conflituosidade próprias do império – por exemplo, a extensão do seu domínio a outros povos – o autor apresenta um quadro geral de respeito das formas fundamentais da organização social. Assim, o império aparece como um organismo estatal fundado na articulação de células (os ayllus) e povos dentro de uma entidade multiétnica integradora4. A conquista, pelo contrário, desencadeia um processo de despovoamento maciço, de abandono das principais vias de transporte, de desagregação social e institucional em grande escala e de perseguição da alteridade5. Mariátegui identifica o colonialismo da dominação espanhola no seu caráter predador e vampírico fundado, primeiro, no saque das riquezas materiais do defunto império, e em seguida na extração de matérias-primas. Neste sentido, a conquista inaugura uma relação inorgânica entre quem tem o domínio político e militar sobre o território e as populações que nele vivem. Uma dualidade se estabelece na qual uma ordem sem raízes nos costumes e na história dos povos subjugados se impõe: uma ordem portanto artificial. A leitura de Mariátegui instaura então uma oposição entre naturalidade, organicidade e artificialidade para além do estudo das características ideológicas (religiosas, jurídicas, etc.) do império inca e da colônia. O tecido produtivo, a força de trabalho disponível e as modalidades do trabalho, enfim, a finalidade da organização econômica são brutalmente alterados em prol da rentabilidade a curto ou médio prazo para a metrópole.

O critério econômico que rege a análise mariateguiana do território peruano revela continuidades históricas profundas e geograficamente marcadas. Assim, o Peru moderno é caracterizado como uma formação costeira que conserva o antigo medo dos indígenas das montanhas:

La raza y la lengua indígenas, desalojadas de la costa por la gente y la lengua españolas, aparecen hurañamente refugiadas en la sierra. Y por consiguiente en la sierra se conciertan todos los factores de una regionalidad si no de una nacionalidad. El Perú costeño, heredero de España y de la conquista, domina desde Lima al Perú serrano; pero no es demográfica y espiritualmente asaz fuerte para absorberlo6.

Ao Peru da serra, demograficamente dominado por indígenas, se opõe um Peru litoral criado pelos diversos grupos que se instalaram ao longo dos séculos: espanhóis e criollos, negros escravizados, imigrantes chineses, árabes, japoneses e europeus.

Essa dualidade se funda não apenas na hierarquia de raças imposta após a conquista, mas também em práticas econômicas distintas: as comunidades indígenas sobreviventes conservam “elementos de socialismo prático”7, enquanto a incipiente industrialização, a gradual generalização do trabalho assalariado e a presença de grandes companhias capitalistas estrangeiras configuram um capitalismo atrasado no litoral. Ademais, as grandes propriedades privadas, os latifúndios que Mariátegui assemelha ao feudalismo, se mantêm na serra. Assim, numa passagem famosa dos 7 ensaios o autor identifica elementos de “três economias”8 que conformam a formação social peruana. Porém, a figura da dualidade permanece como a grande continuidade originada na queda dos Incas, pois tanto os grandes latifundiários como os comerciantes das cidades perpetuam os traços fundamentais da ordem inaugurada com a conquista: a exclusão dos indígenas e sua exploração como força de trabalho, a dominação de uma elite branca cuja riqueza decorre da propriedade da terra e dos seus vínculos com a metrópole imperial ou com uma potência central do capitalismo9. De fato, olhando para as determinações econômicas, Mariátegui identifica uma unidade entre burguesia e latifundiários, que reside principalmente no seu papel rentista. Diversos termos aparecem no texto para qualificar o lugar desse grupo: “profiteurs10, rentistas, intermediários dos imperialistas. Faltando-lhes capitais e uma visão a longo prazo, o seu desempenho econômico não é direcionado ao desenvolvimento dos meios de produção, mas sim subordinado à mentalidade extrativista do garimpeiro. Por contraste, Mariátegui salienta o vínculo muito forte que une a população indígena com a terra que a mesma trabalha e como, no passado pré-hispânico, uma população duas vezes maior não tinha dificuldades em produzir alimentos em quantidades suficientes11.

À histórica dualidade de raças se sobrepõe uma oposição socioeconômica, que por sua vez caracteriza relações contraditórias ao território, à natureza e às populações. Para Mariátegui, nas suas práticas quotidianas, os indígenas conservam vínculos orgânicos entre si e com a terra, dos quais carecem os membros da elite latifundiária ou comercial. Perpetua-se, portanto, a oposição entre naturalidade e artificialidade através da composição de classes, mas sobretudo através do lugar ocupado no processo produtivo: a sobrevivência de práticas ancestrais de cultivos e de hábitos coletivistas de trabalho se contrapõe a uma classe rentista predadora que pratica a acumulação de capital por espoliação ou extração em larga escala. Mariátegui evoca o desprezo da elite plutocrática republicana pelo “capital humano”:

Los que pensaron que la riqueza del Perú eran sus metales preciosos, convirtieron a la minería, con la práctica de las mitas, en un factor de aniquilamiento del capital humano y de decadencia de la agricultura12.

Mariátegui mobiliza a categoria de feudalismo para qualificar o poder dos gamonales, os latifundiários da serra. Algumas observações são aqui indispensáveis. Primeiro, a nível terminológico cabe ressaltar que o termo é onipresente nos textos marxistas da época, e que os debates historiográficos marxistas sobre o tema aparecem posteriormente. Isso para clarificar que o uso do termo é datado e não corresponde às evoluções da análise histórica atual13. Em um segundo momento, para além da questão semântica, é imprescindível notar o papel que esse feudalismo cumpre na formação social peruana para Mariátegui. Com efeito, a classe dominante peruana é dividida em grupos diversos. Ao lado de uma burguesia comercial e financeira, surgida a partir do fim dos anos 1860, existe uma camada de empreendedores de pequeno porte, cujos investimentos são direcionados para a indústria leve e alimentícia14. Não obstante, o poder econômico está concentrado nas mãos de grandes famílias latifundiárias, que fornecem também o grosso da classe política. Finalmente, proprietários de latifúndios menores vivem fora das cidades, nas suas terras, e formam as aristocracias provincianas – frequentemente envolvidas nas revoltas regionalistas que sacodem o Peru no século XIX.

Os setores tradicionalmente associados ao capitalismo (o setor industrial e o setor comercial) ocupam uma posição subalterna em relação aos latifundiários, com pouco acesso ao crédito e pouca competitividade frente às mercadorias e às empresas de potências já industrializadas. Portanto, a situação do Peru, a sua inserção no mercado mundial, participa do enfraquecimento de setores potencialmente dinamizadores da economia nacional. Além disso, a posse da terra herdada do sistema colonial participa da manutenção de uma mentalidade rentista pouco compatível com os investimentos e a modernização do aparelho produtivo15. Sob esses aspectos, Mariátegui identifica um setor pré-capitalista que age em prol dos seus interesses e bloqueia o desenvolvimento de uma economia verdadeiramente capitalista e liberal. Nesse sentido, o grupo dos gamonales agrega várias características feudais: a concentração da terra e poder o sobre quem vive nela, o bloqueio da circulação de trabalhadores e mercadorias (ou seja, eles impedem a formação de um mercado interno de trabalho). Assim, quando fala de pré-capitalismo no Peru, Mariátegui distingue os vestígios da antiga formação coletivista indígena, cuja natureza orgânica profundamente enraizada permitiu que ela se mantivesse, e a permanência do poder decorrente dos latifúndios, originado na conquista e que configura a oligarquia que controla o Estado nacional.

O pré-capitalismo é então um traço dominante da economia peruana, apesar das modernizações acontecendo em certas cidades e da penetração imperialista com seus enclaves. Mariátegui revela uma realidade complexa, feita da articulação de modos distintos de produção e reprodução, sem em nenhum momento cessar de ressaltar o caráter colonial do conjunto. Tanto as terras mal exploradas quanto as fazendas mais modernas funcionam sob a hegemonia imperialista, imposta a partir dos países centrais através do acesso ao crédito e aos mercados de matérias-primas, e como fonte de bens industrializados mais competitivos. Em um comentário sobre a obra de Mariátegui, Aníbal Quijano mostrou como os setores pré-capitalistas da economia são uma fonte de mão de obra barata reproduzida fora dos enclaves capitalistas16. O setor latifundiário, “feudal”, é portanto o obstáculo ao desenvolvimento não apenas de uma burguesia nacional capitalista, mas também das comunidades indígenas cujas terras são expropriadas em proveito de gamonales incapazes de melhorar os rendimentos por estarem isolados do mundo da produção. A “liquidação” do feudalismo aparece então como tarefa central de qualquer projeto emancipador. A questão crucial é saber se essa tarefa pode ser levada a cabo mediante uma modernização capitalista radical encabeçada pelos setores capitalistas e as crescentes classes médias, ou por um projeto mais ambicioso que se nutra do coletivismo indígena e do socialismo moderno. Em outros termos, a questão colocada é saber se uma burguesia pode se desenvolver e resolver o problema da fragmentação nacional, ou se tal caminho está vedado.

Natureza, cultura, civilização

A alternativa entre desenvolvimento burguês e revolução socialista é rapidamente resolvida por Mariátegui. Se o obstáculo é o setor latifundiário e o gamonalismo como sistema de poder, a hipótese de uma burguesia liberal derrubando essa ordem pressupõe que a mesma possa liderar as massas populares em um projeto modernizador e mais igualitário. Em uma nota de rodapé famosa, Mariátegui nega essa possibilidade: “no existe en el Perú, como no ha existido nunca, una burguesía progresista, con sentido nacional, que se profese liberal y democrática y que inspire su política en los postulados de su doctrina”17. A burguesia se revela incapaz de liderar eficazmente um modelo que supere o obstáculo latifundiário, entre outras razões, porque participa do exercício do poder com aquele setor e por inadequação própria para essa tarefa. Em um texto escrito para a Primeira conferência comunista da América Latina, organizada em Buenos Aires em 1929, Mariátegui e os delegados peruanos insistem na psicologia e na força dos preconceitos que a classe dominante como um todo herdou do período colonial. Em particular, o racismo contra os indígenas e os negros aproxima mais essa classe dos imperialistas do que das massas populares nacionais18. A dualidade de alma, incorporada em dualidade de raças opostas durante séculos impede, portanto, a realização de um programa político elaborado para um desenvolvimento realmente nacional, ou seja, que não suponha a exclusão da imensa maioria do exercício dos direitos políticos e sociais. Contudo, nessa leitura, a solidariedade de classe se agrega a uma solidariedade de raça que participa no esvaziamento de qualquer projeto burguês progressista. A classe dominante aparece então como um grupo eminentemente parasitário, incapaz de formular um verdadeiro projeto inclusivo e orgânico sui generis. Mariátegui retoma o velho argumento de Manuel González Prada, para quem a nacionalidade não se encontrava nessa classe dominante branca, mas sim nas multidões serranas, nas vastas camadas populares excluídas e exploradas19.

O caráter parasitário da classe dominante não surge por acaso. Na leitura mariateguiana, ele corresponde à herança institucional espanhola fundada mais na extração de riquezas do que no desenvolvimento da produção, o que redunda na inserção subalterna no mercado mundial. A própria artificialidade dessa classe aparece como o fator explicativo da sua inépcia política e econômica, unicamente determinada pela manutenção do seu domínio. Nesse ponto, Mariátegui identifica a colusão da classe dominante com a penetração do imperialismo na economia nacional, e a ausência de compromisso para a modernização do tecido produtivo. Mariátegui demonstra ainda que mesmo nos ramos da economia dominados por peruanos, os capitais imperialistas se impõem gradualmente para remediar os péssimos rendimentos (os exemplos citados em 7 ensaios são de grandes fazendas de cana-de-açúcar, mas o mesmo processo se verifica com os setores bancário, logístico, petrolífero, etc.20). Assim, os interesses objetivos dos grupos que compõem a classe dominante impossibilitam um projeto político que possa levar a cabo a “segunda independência”, que Mariátegui teoriza como uma independência que altere a condição peruana de economia colonial21.

Por outro lado, o estudo do autor dá ênfase aos hábitos coletivistas sobreviventes nas comunidades indígenas. O pré-capitalismo, nesse caso, toma a forma de uma resistência secular aos ataques do período colonial e, depois, do período republicano. A alteridade radical de civilização, de raça e de organização socioeconômica que as separa do modelo criollo participa da longevidade de práticas que não foram assimiladas pelos grupos dominantes. Para além da dimensão hereditária, Mariátegui identifica na vigência de “elementos de socialismo prático” uma prova da vitalidade da cultura indígena, que se mantém por ser profunda e organicamente parte da identidade desses povos22. A artificialidade parasitária do Peru espanhol e criollo aparece de modo gritante quando confrontada com a resistência das comunidades. Em particular, Mariátegui identifica uma oposição ética e moral decorrente do lugar na produção. Ele se inspira na leitura do sindicalista revolucionário Georges Sorel, em especial na “moral de produtores”23 entendida como fruto do processo de produção conduzido por pessoas livres e não subjugadas, capazes de decidir coletivamente o rumo que a sociedade deve seguir. A moral de produtores é aqui bastante próxima do que o marxismo chama de consciência de classe, que se desenvolve por via da ação política dos militantes mas sobretudo nas lutas de classes, em que trabalhadores e proprietários dos meios de produção entram em conflito, evidenciando assim o lugar de cada grupo no processo de produção. Em suma, a oposição entre a classe dominante proprietária dos meios de produção e os proletários fabris das cidades é a mesma que opõe os latifundiários às comunidades indígenas e aos indígenas empregados nas fazendas em condições de semi-servidão. Simetricamente, os hábitos coletivistas de trabalho dos indígenas assim como a propriedade comum da terra encontram eco no socialismo moderno. Portanto, para Mariátegui, o pré-capitalismo coletivista dos povos originários encontra a doutrina socialista para além da organização pré-capitalista latifundiária ou mesmo do incipiente capitalismo peruano. Como produtores de valor, indígenas e proletários compartilham um lugar e práticas coletivistas, e portanto disposições morais e éticas de solidariedade e de luta. Em outras palavras, a práxis dos atores é produtora de sentido e de conteúdo metafísico. Esse ponto é crucial na obra de Mariátegui, pois permite vislumbrar uma possibilidade de sociedade comunista fundada na práxis dos diversos grupos das classes populares.

O vínculo que Mariátegui evidencia entre as massas indígenas e os demais setores populares é estreitamente ligado à sua análise do parasitismo e da artificialidade do modelo de sociedade que a classe dominante peruana impõe. Assentando o seu argumento na realidade socioeconômica e na análise das relações de produção concretas, o peruano defende uma estratégia revolucionária que concorra para uma definição larga da classe trabalhadora. Assim, o pré-capitalismo coletivista das comunidades indígenas não é um fator de atraso – ao contrário dos gamonales –, mas sim a manifestação de uma potencial aliança dos trabalhadores para além dos preconceitos de raça e das dualidades que até então fragmentaram a nacionalidade, o território e a economia do Peru. Frente a uma classe dominante cujos interesses materiais e condições subjetivas formam um obstáculo tanto à formação de uma nação genuína como a qualquer passo em direção a uma emancipação, Mariátegui teoriza a união dos diversos sujeitos das massas populares em um conjunto revolucionário definido pela práxis produtiva: a classe trabalhadora.

Ademais, na visão de Mariátegui, já chegou a última hora da civilização liberal. O tema da decadência europeia pode ser rastreado desde as primeiras conferências marxistas em 192324. Enquanto observador atento à cena internacional, Mariátegui contrapõe ao modelo liberal burguês imperialista as lutas pela autodeterminação dos povos coloniais, e sobretudo o socialismo marxista. Retomando outro conceito soreliano, ele interpreta o pós-Primeira Guerra como um momento de transição da civilização individualista para outra, coletivista, materializada pela perda de apelo dos grandes mitos políticos da burguesia ocidental: o progresso, a razão, a ciência. Pelo contrário, os mitos da revolução e da liberação da humanidade atravessam o planeta e acordam velhos “povos em colapso” que exigem sua independência25. Do México à China, passando pela Irlanda, a Turquia e a Índia, Mariátegui analisa a onda de movimentos sociais transformadores como manifestações singulares de um mesmo momento histórico, no qual a crise do capitalismo cria as condições materiais objetivas da sua superação26. Portanto, o modelo liberal burguês é um fetiche já superado, uma forma declinante à qual as potências imperialistas se agarram, ao passo que abraçar o socialismo significa se juntar ao movimento da história. Neste sentido amplo e civilizatório, Mariátegui descarta toda “etapa democrática burguesa” como incapaz de projetar o Peru no novo período mundial que se abre, pois o capitalismo está na fase imperialista, na qual os países que iniciaram tardiamente na competição econômica mundial serão sempre confinados a um papel colonial. O socialismo, por sua vez, brota como aspiração à libertação dos povos e da classe trabalhadora, e à solidariedade internacionalista.

Desse modo, tanto nacionalmente quanto no campo internacional, a via do desenvolvimento capitalista é condenada à perpetuação da dualidade de raças, de classes e até de alma que fragmenta o Peru. Mariátegui inverte o argumento segundo o qual o atraso econômico do país se deve à população indígena avessa ao progresso: o obstáculo está do lado da classe dominante, cuja burguesia é incapaz de assumir a função histórica de criação de um verdadeiro mercado nacional eficiente. A artificialidade do modelo de Estado herdado do período colonial se perpetua com os dirigentes do século XX. Mariátegui delineia uma saída dialética, que junte os elementos indígenas majoritários com o incipiente proletariado urbano em prol de um nacionalismo inclusivo e enraizado, ou seja, que possa reivindicar naturalidade e organicidade.

Do ethnos ao demos: a política como agente cristalizador da nação peruana

Apelando à práxis, Mariátegui resolve a questão teórica de como o socialismo, surgido dentro da modernidade capitalista, pode sintetizar aspirações de operários (fabris e agrícolas) e de povos indígenas majoritariamente camponeses. Dois elementos-chave participam desse movimento. O primeiro é o resgate do comunismo agrário das comunidades indígenas como parte da tradição nacional27. Mariátegui rejeita o hispanismo das visões mais conservadoras da história peruana e reivindica o comunismo inca como parte fundamental do passado nacional. O segundo elemento central é a ideia de que o comunismo inca e o comunismo moderno são consanguíneos28, que, apesar de corresponderem a formações sociais historicamente distintas, apresentam uma similaridade essencial no caráter coletivo da propriedade e da organização do trabalho. O socialismo moderno herda do liberalismo a revindicação da emancipação individual, da liberdade política e da democracia, insistindo sempre no real concreto das relações de produção. Com o comunismo inca, Mariátegui pretende encontrar um terreno fértil e que predispõe os camponeses indígenas a tomar parte na luta socialista. Em um texto emblemático de 1928, o autor escreve: “El socialismo, en fin, está en la tradición americana. La más avanzada organización comunista, primitiva, que registra la historia, es la inkaica”29. A semelhança dos dois socialismos aparece como a oportunidade de reconciliar os elementos diversos e fragmentados do Peru.

Mariátegui inverte a representação da época sobre as comunidades indígenas e os povos coloniais em geral. O peruano não somente nega a possibilidade de uma emancipação nacional liderada pela burguesia peruana, como também atribui aos povos indígenas uma familiaridade maior com a modernidade, através do socialismo moderno. O caráter pré-capitalista do “comunismo inca” e das suas formas vigentes nos anos 1920 é lido como a prova da presença do socialismo no passado nacional, e portanto como a possibilidade de uma reunião com o socialismo do século XX. Fernanda Beigel fala de uma “triangulação do tempo”30, em que no presente se atualiza o passado para se projetar um futuro. É justamente porque a vasta maioria do povo peruano é composta por camponeses indígenas ainda ligados ao seu passado pré-hispânico que o socialismo moderno tem chances de incarnar a superação do modelo colonial. Assim, a nação peruana não nasce da conquista nem da Independência, ela está por criar, e a inclusão das massas indígenas é sua condição sine qua non, inclusão possível somente se o modelo nacional tiver raízes no passado indígena. Em outros, a nação futura tem de reatualizar os hábitos existentes das comunidades indígenas no marco de um socialismo nascido do capitalismo. O socialismo no Peru aparece então simultaneamente como a condição de possibilidade de uma nação realmente inclusiva, e a expressão/continuidade de uma tradição popular reprimida. Neste sentido, Mariátegui coloca a revolução no Peru fora do eurocentrismo dominante no marxismo, pois não subordina o socialismo peruano ao movimento operário nos países centrais do capitalismo.

Na conferência de Buenos Aires já mencionada, o debate que opõe os representantes peruanos aos delegados mais próximos da Comintern é revelador da tensão entre artificialidade e naturalidade, organicidade. Diante da posição de apoio da Internacional à formação de um Estado indígena, os peruanos defendem uma aliança larga dos setores operários com os camponeses indígenas, no âmbito de um movimento da classe trabalhadora amplamente definida. Para eles, um Estado indígena não escapa, por ser indígena, às determinações de classe do mundo dominado pelo imperialismo31. Além disso, a ideia de limitar a autodeterminação dos povos indígenas à construção de um Estado ad hoc reproduz o esquema histórico eurocêntrico no qual a revolução é liderada pelo proletariado urbano e fabril. Aqui, as teses mariateguianas permitem identificar o caráter artificial de uma análise limitada à reprodução de um modelo europeu, que não imagina as massas camponesas como parte do sujeito revolucionário. Mais ainda, separando a questão nacional da questão da raça e da terra, a Comintern não considera a vinculação dialética existente entre esses três aspectos, quando é justamente nessa intersecção que é renovada a questão indígena através dos laços com o socialismo moderno. O socialismo “indo-americano”32 que Mariátegui prega procura raízes no passado e no presente dos povos das Américas para poder se desdobrar de maneira original e orgânica. É nos traços já existentes, aproveitáveis, que reside a naturalidade do socialismo, por oposição à artificialidade do liberalismo burguês e do etapismo mecanicista.

No entanto, “natureza” não seria outro nome para “essência”? A interpretação mariateguiana não levaria a uma reprodução paradoxal do racismo, essencializando tanto a artificialidade como a naturalidade? A própria estrutura argumentativa dos textos de Mariátegui permite descartar essas interrogações. Como fica claro na leitura de 7 ensaios, a análise é fundamentada no papel econômico dos grupos que formam tanto as elites quanto as camadas populares. Quando ele advoga uma definição ampla da classe trabalhadora e uma luta comum a índios e não índios, Mariátegui imagina a criação de uma entidade emancipadora que supere a divisão de raças vigente desde a conquista. Apostando na comunidade de luta dos diversos segmentos da classe trabalhadora e na aliança possível com setores da classe média, o peruano desenvolve uma proposta contrária à ideia de um ethnos como fundamento do Estado-nação peruano. São as lutas em comum, nutridas pelas lutas passadas e pela história secular da maioria do povo, que acarretam um futuro socialista possível. Neste sentido, ao ethnos homogeneizador Mariátegui opõe um demos cuja definição é política e econômica. A artificialidade não é resolvida por mais uma divisão – por exemplo na formação de um Estado indígena – mas pelo movimento revolucionário. Na sua visão, o mito da revolução social carrega uma aspiração à libertação que se estende aos diversos setores da classe trabalhadora, possibilitando uma “peruanidade” que brote “de baixo”, da práxis dos produtores mesmos.

Considerações finais

O projeto da construção de um “Peru integral” a partir de um demos entendido como comunidade política supõe um profundo trabalho de releitura crítica da história nacional peruana. O objetivo revolucionário é então mediado por uma exigência de conhecimento que torna inoperante toda aplicação mecânica de sistemas e estratégias. Para José Aricó, esse “critério da realidade”33 é um elemento medular do materialismo de Mariátegui. O estudo aprofundado da formação econômica do Peru e da questão indígena no seu conteúdo econômico, em particular agrário, decorre da necessidade do conhecimento para a formulação de uma estratégia que não seja uma cópia pobre. Neste sentido, Mariátegui compartilha a posição de certo heterônimo criado por Fernando Pessoa: não há um grande conceito único que possa reger o mundo em cada um dos seus aspectos. Porém, Mariátegui complementa o relativismo extenso do poeta com uma procura das conexões entre uma realidade situada e o mundo. A originalidade de Mariátegui surge de seu compromisso revolucionário com o mundo e com o Peru, e o esforço para pensar os dois juntos implica alterações teóricas substantivas.

Assim, tanto os conceitos de nação, economia colonial, cultura, civilização e comunidade coletivista indígena como as palavras de ordem destinadas a organizar a classe trabalhadora são retrabalhados para encontrar uma base na práxis real dos sujeitos políticos. Ao contrário dos membros da elite peruana, mas também de membros eminentes da Comintern, Mariátegui pretende participar na elaboração das condições de uma revolução no Peru e no mundo a partir das formas particulares da inserção no mercado mundial. Portanto, a naturalidade, ou organicidade, se relaciona diretamente com a faculdade da teoria e da prática revolucionárias de se articularem com aspirações afins ao marxismo presentes na população. A artificialidade caracteriza o olhar incapaz de ver além do “atraso” e dos empecilhos ao desenvolvimento pensado como uma sequência linear. A polaridade natureza/artifício ilumina a metodologia e a prática teórica de Mariátegui e permanece como imperativo científico e político hoje, pois corresponde à capacidade de construir alternativas de conhecimento e de organização desde abaixo.

Bibliography

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Notes

1 Philippe Descola, Par-delà nature et culture, Paris, Gallimard, 2015, p. 21. Return to text

2 Antonio Melis, “Mariátegui, primer marxista de América”, in José Aricó (dir.), Mariátegui y los orígenes del marxismo latinoamericano, Mexico, Cuadernos Pasado y Presente, 1978, p. 201‑225. Return to text

3 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos de Interpretación de la Realidad Peruana, Caracas, Fundación Biblioteca Ayacucho, 2007, p. 7. Return to text

4 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 65. Return to text

5 John Charles Chasteen, Born in blood and fire: a concise history of Latin America, New York, W.W. Norton & Company, 2016, p. 44. Return to text

6 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 171. Return to text

7 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 41. Return to text

8 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 20. Return to text

9 Carlos Contreras et Marcos Cueto, Historia del Perú contemporáneo: desde las luchas por la independencia hasta el presente, Lima, IEP, 2007, p. 205. Return to text

10 Em francês no texto. Return to text

11 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 7. Return to text

12 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 48. Return to text

13 Jérôme Baschet, La civilisation féodale. De l’an mil à la colonisation de l’Amérique, Paris, Éditions Flammarion, 2018. Return to text

14 Martín Monsalve, “Industria y mercado interno, 1821-1930”, in Compendio de historia económica del Perú, Economía de la primera centuria independiente, Lima, IEP-BCRP, 2011, p. 274. Return to text

15 Carlos Contreras et Marcos Cueto, Historia del Perú…, p. 241. Return to text

16 Aníbal Quijano, Introducción a Mariátegui, Lima, Mosca Azul Editores, 1981. Return to text

17 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 28. Return to text

18 Secretariado Sudamericano de la Internacional Comunista, El movimiento revolucionario latinoamericano. Versiones de la Primera Conferencia Comunista Latinoamericana, Buenos Aires, La Correspondencia Sudamericana, 1929, p. 265. Return to text

19 Manuel González Prada, Paginas libres. Horas de Lucha, Venezuela, Biblioteca Ayacucho, p. 46. Return to text

20 José R. Deustua C., Guano, salitre y petróleo en la economía peruana, 1820-1930, in Compendio de historia económica del Perú, Economía de la primera centuria independiente, Lima, IEP-BCRP, 2011, p. 217. Return to text

21 José Carlos Mariátegui, Ideología y Política, Lima, Biblioteca Amauta, 1986, p. 87. Return to text

22 Miguel Mazzeo, El socialismo enraizado: José Carlos Mariátegui; vigencia de su concepto de “socialismo práctico”, Lima, Fondo de Cultura Económica, Política y derecho, 2013, p. 238. Return to text

23 Georges Sorel, Réflexions sur la violence, Paris, Slatkine, 1981. Return to text

24 José Carlos Mariátegui, Historia de la Crisis Mundial, Lima, Biblioteca Amauta, 1986. Return to text

25 José Carlos Mariátegui, El Alma Matinal, Lima, Biblioteca Amauta, 1970, p. 26. Return to text

26 José Carlos Mariátegui, La Escena Contemporánea, Lima, Biblioteca Amauta, 1975, p. 190. Return to text

27 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 43. Return to text

28 José Carlos Mariátegui, 7 Ensayos..., p. 26. Return to text

29 José Carlos Mariátegui, Ideología y Política, p. 249. Return to text

30 Fernanda Beigel, El itinerario y la brújula: el vanguardismo estético-político de José Carlos Mariátegui, Buenos Aires, Biblos, 2003, p. 22. Return to text

31 Secretariado Sudamericano de la Internacional Comunista, El movimiento…, p. 288. Return to text

32 José Carlos Mariátegui, Ideología y Política, p. 249. Return to text

33 José Aricó (dir.), Mariátegui y los orígenes del marxismo latinoamericano, Mexico, Ediciones Pasado y Presente, 1978, p. 21. Return to text

References

Electronic reference

Jean-Ganesh Leblanc, « Natureza e artificialidade no projeto socialista de nação de José Carlos Mariátegui », Textures [Online], 27 | 2023, Online since 02 juin 2023, connection on 20 juillet 2025. URL : https://publications-prairial.fr/textures/index.php?id=496

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Jean-Ganesh Leblanc

Université Lumière Lyon 2, LCE (Lettres et civilisations étrangères), F-69007 Lyon, France

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